sábado, 17 de maio de 2014

DÉCIMO PRIMEIRO TEMA SEM JÚBILO



I

Por que dói essa Casa em tua vida,
e ainda que dela fujas, a inquietude
não pára nunca de permanecer?

Será porque da Casa não vislumbras
seu recôndito oásis, ou a perda,
por teus olhos, do fogo da morada?

Ou porque da morada tens a imagem
das suas portas visíveis, e não da alma,
que dança pela Casa e as portas doura?

II

Além da Casa que alicerces sondas,
que escadas te conduzem na vertigem
que o cansaço do perto leva ao longe?

Que existirá no longe que não haja
em tudo que te habita de mais próximo,
onde quer que se instale a tua Casa?

Ou, depois de instalada, se perturba
teu Sonho, aprisionado nas paredes,
tal se alguma prisão nascesse delas?

III

Que urdes além do centro da morada,
que nela não esteja, e ardendo nela:
o fora e o dentro, o próximo e o remoto?

Mas por que dói a Casa, ainda que saibas
que o verme que a corrói é teu invento,
e a fuga que te move não tem asas?


Qual é mais poderoso: o homem ou a Casa,
o homem que se move atrás do mesmo,
ou, sem mover-se, a Casa em sua paz?

Ângelo Monteiro. Todas as coisas têm língua. Recife: CEPE, 2008, p.305