Quien se queda mucho consigo mismo, se envilece.
Antonio Porchia, Voces reunidas, 2006, p.50.
sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013
segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013
9.2
Manhã luminosa,
pura, calma, azul!
Solidão da rosa
sob o céu azul.
Livre, aberto, nítido,
tudo que se dar.
Mas, sensato e tímido,
desvias o olhar.
Tudo está maduro
para as tuas mãos.
No entanto, inseguro,
recolhes as mãos.
Pródiga, serena
(nem boa, nem má),
vida clara e plena
— quem a colherá?
Marco
Catalão, Antes de amanhã, LivroPonto,
2008, p.83.
O VÍRUS
Meia-noite. Depois de um dia inteiro
de trabalho árduo, o que eu não
esperava
ocorre: o mouse de repente trava.
Engasgo. Sinto um calafrio ligeiro.
Digo à tela: “Era só o que me
faltava...”
Tento reiniciar. Em vão. Primeiro
com método, depois com desespero,
faço tudo o que posso, mas na oitava
tentativa desisto. Meus suspiros
são inúteis. Perdi de uma só vez
tudo o que tinha feito em mais de um
mês.
A morte é esse dissimulado vírus:
se instala em nosso software, secreta,
e antes que a percebamos nos deleta!
Marco
Catalão, O cânone acidental,É
realizações, 2009, p.49.
Mais do e sobre o poeta aqui: http://apoesiadobrasil.blogspot.com.br/2012/03/marco-catalao-1974.html
sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013
SONETO
O
silêncio madruga nos ponteiros.
Sinto a força dos astros repartida
em nosso ser à proporção da forma
e fundo permutados nos sentidos.
Sinto a força dos astros repartida
em nosso ser à proporção da forma
e fundo permutados nos sentidos.
O retiro
emergido neste espaço
é o equilíbrio de exata proporção.
Um horizonte vasto se revela
além dos muros físicos do mundo.
é o equilíbrio de exata proporção.
Um horizonte vasto se revela
além dos muros físicos do mundo.
E o
pensamento logo se emotiva
ao contemplar a sensação da vida
em completude plena de existência,
ao contemplar a sensação da vida
em completude plena de existência,
que
adensa o instante desta solitude.
Mas vem o sono, imensa paz, enquanto
a noite decompõe-se lentamente.
Mas vem o sono, imensa paz, enquanto
a noite decompõe-se lentamente.
Claudio Sousa Pereira
sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013
Só o dom do pó
Junto a essas águas basta,
E o chacoalhar dos ossos
Nas correntes fundas
Pra que saibam, Arquita, qual foi o nosso fim.
Nessas paragens, lembramos a morada antiga,
A abóbada celeste, o arco pleno e distante.
Mas aqui só sentimos o que já foi,
E o que vemos, não existe;
Nossa memória, o Letes
Só dissolveu uma parte,
E pela doçura do vivido,
Nosso cerne anseia ainda.
Sim, faríamos tudo para voltar,
Inda que como escravos,
Carregando fardos dia a dia,
E eu diria tudo o que calei,
Sentiria tudo o que adiei.
Já sem corpos, inda amamos,
Mas aqui no Orco
As sombras não se tocam.
Ah, ter cruzado o portal terrível,
Velhos ou jovens, felizes ou infelizes,
Encontrando a sepultura
Entre os bramidos e os esguichos do sal, sem poeta
Para grafar na face móvel das águas
Um dístico em nosso nome —
Sem consolo ou mão amada.
Vai, manda dizer, Arquita,
Que estamos aqui
E ansiamos pela voz dos amigos.
Lawrence Salaberry, Engano especular, Ed. É Realizações, 2012, p.8-9
Mais do e sobre o poeta aqui:
http://www.dicta.com.br/edicoes/edicao-3/seis-poemas/
Junto a essas águas basta,
E o chacoalhar dos ossos
Nas correntes fundas
Pra que saibam, Arquita, qual foi o nosso fim.
Nessas paragens, lembramos a morada antiga,
A abóbada celeste, o arco pleno e distante.
Mas aqui só sentimos o que já foi,
E o que vemos, não existe;
Nossa memória, o Letes
Só dissolveu uma parte,
E pela doçura do vivido,
Nosso cerne anseia ainda.
Sim, faríamos tudo para voltar,
Inda que como escravos,
Carregando fardos dia a dia,
E eu diria tudo o que calei,
Sentiria tudo o que adiei.
Já sem corpos, inda amamos,
Mas aqui no Orco
As sombras não se tocam.
Ah, ter cruzado o portal terrível,
Velhos ou jovens, felizes ou infelizes,
Encontrando a sepultura
Entre os bramidos e os esguichos do sal, sem poeta
Para grafar na face móvel das águas
Um dístico em nosso nome —
Sem consolo ou mão amada.
Vai, manda dizer, Arquita,
Que estamos aqui
E ansiamos pela voz dos amigos.
Lawrence Salaberry, Engano especular, Ed. É Realizações, 2012, p.8-9
Mais do e sobre o poeta aqui:
http://www.dicta.com.br/edicoes/edicao-3/seis-poemas/
quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013
Como se o nada
fosse um dom perfeito
habitamos, em
vão, um vago esboço
de onde nos
surge a tela e os seus remorsos —
dois olhos mal
despertos se entreabrindo.
Nada há mais a
dizer — pois tudo é espanto —
mas há
impressões que duram a vida toda.
E, mesmo assim,
vagamos pela noite,
de repente,
cansados de infinito,
habitantes dos
sonhos e das pragas,
nada sabendo
sobre o tempo... Toda
palavra se
renova em seu ofício,
todo verso
vasculha velhas cinzas.
Como quem
redescobre antigas chagas,
olhamo-nos como
quem olha um berço.
Silvério Duque,
A pele de Esaú, Ed. Via Litterarum, 2010, p.27
Mais do poeta aqui: http://poetasilverioduque.blogspot.com.br/
terça-feira, 5 de fevereiro de 2013
ESTA NOITE
Esta noite, em meu sonho (a multidão
ovacionava o rei; um voo de ave
em movimento esdrúxulo; o conclave
dos cardeais de abril e seu jargão),
eu estava desperto, e minha mão
procurava no escuro a obscura
chave
que abrisse a porta, resolvesse o
enclave
(mesmo que não houvesse solução) —
e eu era outro, sem sê-lo, nem
melhor,
nem eu mesmo, mas outro, mas Alguém,
num janeiro, entre os hunos — e
uma flor
na lapela do equívoco (que
importa?). —
Esta noite, em meu sonho, como
quem
se esquiva ou atravessa alguma
porta.
Renato Suttana. Conversa de
espantalhos, Editora Sol Negro,
2012. p.57
Livros e poemas de Renato Suttana
aqui: http://www.arquivors.com/
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