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Despojo
triste, corpo mal nascido,
escura
prisão, e peso grave,
quando,
rota a cadeia, e volta a chave,
me
verei de ti solto, e bem remido?
Quando,
c’o esprito pronto, aos céus erguido,
(depois
que est’alma em lágrimas bem lave)
batendo
as asas, como ligeria ave,
irei
aos céus buscar meu bem perdido?
Triste
sombra mortal, e vã figura
do
que já fui, uns dias só sostida
daquele
esprito por quem cá vivia,
quem
te detém nesta prisão tão dura?
Não
viste a clara luz, a santa guia,
que
te lá chama à verdadeira vida?
António Ferreira, Poemas lusitanos. Lisboa: Fundação
Calouste Gulbekian, 2000, p.80.