domingo, 25 de maio de 2014

O DIABO E A CRIANÇA

      Um dia o Diabo viu uma criança fazendo com o dedo um buraco na 
areia e perguntou-lhe que diabo de coisa estaria fazendo.
      -- Ué! não vês? Estou fazendo com o dedo um buraco na areia! -- espantou-e a criança.
      Pobre Diabo! O seu mal é que ele jamais compreenderá que uma coisa
possa ser feita sem segundas intenções.

Mario Quintana. Poesia completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2005, p.334.

sábado, 17 de maio de 2014

DÉCIMO PRIMEIRO TEMA SEM JÚBILO



I

Por que dói essa Casa em tua vida,
e ainda que dela fujas, a inquietude
não pára nunca de permanecer?

Será porque da Casa não vislumbras
seu recôndito oásis, ou a perda,
por teus olhos, do fogo da morada?

Ou porque da morada tens a imagem
das suas portas visíveis, e não da alma,
que dança pela Casa e as portas doura?

II

Além da Casa que alicerces sondas,
que escadas te conduzem na vertigem
que o cansaço do perto leva ao longe?

Que existirá no longe que não haja
em tudo que te habita de mais próximo,
onde quer que se instale a tua Casa?

Ou, depois de instalada, se perturba
teu Sonho, aprisionado nas paredes,
tal se alguma prisão nascesse delas?

III

Que urdes além do centro da morada,
que nela não esteja, e ardendo nela:
o fora e o dentro, o próximo e o remoto?

Mas por que dói a Casa, ainda que saibas
que o verme que a corrói é teu invento,
e a fuga que te move não tem asas?


Qual é mais poderoso: o homem ou a Casa,
o homem que se move atrás do mesmo,
ou, sem mover-se, a Casa em sua paz?

Ângelo Monteiro. Todas as coisas têm língua. Recife: CEPE, 2008, p.305 

sexta-feira, 16 de maio de 2014

segunda-feira, 12 de maio de 2014

OTRO ESBOZO DE POÉTICA


Pero también la hierba posee el don
de acercarme al enigma, al reino incierto
--mi doméstica mística sin tiempo--
que en su ardor material lo extraña todo.

Y al vagar la atención por los papeles
fútiles del pasado, si esa hierba
reverbera un instante en la memoria,
se abre paso el sendero de la obra:

me uno al lento presente, al carmín puro
de las flores exhaustas de los ceibos
volteadas por el viento de la noche
(aún oscuras, aún húmedas de noche).

Ricardo H. Herrera. El espíritu del páramo: cien poemas 1977-2009. Córdoba, Argentina: Ediciones del Copista, 2011, p.131

terça-feira, 6 de maio de 2014

 UN APLAZADO
Habla Friedt


De pronto, como un breve latigazo,
mi nombre, Friedt, estalló en el aula.
Yo me puse de pie, y un poco trémulo
avancé hacia la mesa, entre las bancas.
Era el examen último del curso
y al que tenía más miedo: la gramática.
Hice girar resuelto el bolillero
Las dieciséis bolillas del programa
resonaron en él lúgubremente
y un eco levantaron en mi alma.
Extraje dos: adverbio y sustantivo.

Me dieron a elegir una de ambas
y elegí la segunda. —¿Y qué es el nombre?
díjome uno y me asestó las gafas.
Sentí luego un sudor por todo el cuerpo,
se me puso la boca seca, amarga,
y comprendí, con un terror creciente
que yo del nombre no sabía nada.
Revolvía allá adentro, pero en vano,
me quedé en absoluto sin palabras.

Y empecé a ver la quinta en qué vivíamos:
el camino de arena, cierta planta,
el hermano pequeño, mi perrito,
el té con leche, el dulce de naranja,
¡qué alegría jugar a aquellas horas!
Y sonreía mientras recordaba.
—¡Pero señor —rugió una voz terrible—,
el nombre sustantivo, una pavada!—
Tiré a la realidad: sobre la mesa
los dedos de un señor tamborileaban,
cabeceaba blandamente el otro,
el tercero bebía de una taza.

Hacía gran calor. Yo tengo una
cara redonda, simple, colorada,
los ojos grises y los labios gruesos,
el pelo rubio, la sonrisa clara.
Yo quería jugar, no dar examen
darlo otro día, sí, por la mañana...

Se me nubló la vista de repente,
los profesores se me borroneaban,
adquirió el bolillero proporciones
gigantescas, fantásticas,
oí como entre sueños: Señor mío,
puede sentarse... —Y me llené de lágrimas.

Baldomero Fernández Moreno Aqui: http://www.poesi.as/bfm410120.htm




segunda-feira, 5 de maio de 2014

NUM JARDIM JAPONÊS


Ao minuto de gozo do que chamamos Deus,
fazer silêncio ainda é ruído.

Adélia Prado. Miserere. Rio de Janeiro: Record, 2013, p.85

quinta-feira, 1 de maio de 2014

A TARDE LÍMPIDA


No desfiladeiro das Termópilas
vi, sobrevivente único da chacina,
como a História é só uma tarde límpida.
Pois era a tarde mais límpida que já víramos.
Os companheiros olhavam a nuvem esquecida,
não temiam;
observavam o vento tremulante
nas folhagens,
faziam planos para o dia seguinte
-- que
            não haveria.

Ainda pude ver a nuvem desfazendo-se.

E, então, o estrépito.
A intensa fúria contra a fúria imensa.
Abatíamos e éramos abatidos.
E por certo ainda havia aquela nuvem
quando os ouvi dizer: Matamos todos.
Mas era noite quando abri os olhos
  e fugi.
Quarenta anos coxo, estropiado
em montes da Arcádia amiga.
Sobrevivi. E conto. Aquela
é que foi minha vida: a
tarde
            límpida.

Antonio Brasileiro. Desta varanda. Salvador: P55 Edições, 2011, p.11.