quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013


Como se o nada fosse um dom perfeito
habitamos, em vão, um vago esboço
de onde nos surge a tela e os seus remorsos —
dois olhos mal despertos se entreabrindo. 
 
Nada há mais a dizer — pois tudo é espanto —
mas há impressões que duram a vida toda.
E, mesmo assim, vagamos pela noite,
de repente, cansados de infinito,
 
habitantes dos sonhos e das pragas,
nada sabendo sobre o tempo... Toda
palavra se renova em seu ofício,
 
todo verso vasculha velhas cinzas.
Como quem redescobre antigas chagas,
olhamo-nos como quem olha um berço.
 
Silvério Duque, A pele de Esaú, Ed. Via Litterarum, 2010, p.27