sexta-feira, 7 de agosto de 2015


Solilóquio sem fim e rio revolto --
mas em voz alta, e sempre os lábios duros
ruminando as palavras, e escutando
o que é consciência, lógica ou absurdo.

A memória em vigília alcança o solto
perpassar de episódios, uns futuros
e outros passados, vagos, ondulando
num implacável estribilho surdo.

E tudo num refrão atormentado:
memória, raciocínio, descalabro...
Há também a janela da amplidão;

e depois da janela esse esperado
postigo, esse último portão que eu abro
para a fuga completa da razão.

Jorge de Lima. In_Livro de sonetos. Poemas negros. Rio de Janeiro: Record, 2007, p.163